A voz visionária de James Blake

Ritmo, alma e silêncio. Atitude visionária, minimalismo elegante e uma voz que suspende os sentidos. Eis o álbum de estreia de James Blake

O inglês James Blake, 22 anos, marcou o ano transacto com três magníficos EPs ("The bells sketch", "CMYK" e "Klavierwerke"). Para os mais atentos, não é nenhum desconhecido. O álbum de estreia, que agora é lançado em todo o mundo, surge envolto com o carimbo de "acontecimento", com o que isso tem de potenciador de curiosidade e também de possíveis efeitos prejudiciais.

Ou seja, não é um álbum para o qual se parta com um olhar límpido. Como acontece quase sempre nestes casos, o olhar de muitos já está radicado em juízos pré-definidos. Até nesse sentido será uma obra incontornável de 2011. A história de James Blake, como todas, é nova e velha. Nova, porque aquilo que tem para propor é realmente singular. Velha, porque é recorrente na música popular surgirem projectos em determinado momento do crescimento de uma linguagem (neste caso do dubstep) que a elevam a novos patamares, criando vasos comunicantes com um público mais plural. Aconteceu com Arthur Russell com o movimento "disco", apesar de só recentemente ter sido redescoberto; com os Portishead no período pós-hip-hop; ou com os The xx, mais recentemente, através de um som minimalista, atmosférico, de emoções quase suprimidas. Acontece agora com James Blake, alguém que emerge na cena londrina do dubstep para criar uma sonoridade também ela minimalista, espaçosa, alojando algumas dinâmicas do dubstep (os sub-graves, os ecos, o design sonoro) para erguer a sua própria realidade, projectada em baladas soul cheias de distorção, lamentos em forma de narrativas lacónicas e voz alterada digitalmente, algures entre Bon Iver, Antony e André 3000 dos OutKast.

Há momentos de quase silêncio, mas também apontamentos electrónicos quase industriais. Há batimentos cardíacos digitais ("Unluck", "Wilhelms scream"), mudanças de intensidade quase gospel ("Measurements"), mas também canções vulneráveis em carne viva ao piano ("Limit to your love", versão de uma canção da canadiana Feist, ou "Give me my month" e "Why don't you call me").

Composto, produzido e gravado inteiramente por Blake, o álbum apresenta-se tal e qual foi feito no seu quarto, porque recusou as sugestões das editoras que o pretendiam regravar com um produtor. Fica-lhe bem a atitude. Porque é um disco de canções secretas, de climas introspectivos, de sensibilidade melódica, com uma economia narrativa e pormenores digitais de produção únicos, e que apetece partilhar com poucos, apesar de, felizmente, muitos se irem deixar enredar nas suas malhas. Ainda bem.

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